Hoje tem um vento leve, entrando pela janela, balançando o voal branco das cortinas da sala, vento misturado com Sol. Tenho a sorte de uma fachada leste.
O Sol acende os móveis e as plantas, um Sol morno nesta época do ano. Observo a qualidade sútil dessa manhã vagarosa. Quase posso ver o tempo como grãos de poeira flutuantes no ar. Minha sala, uma ampulheta gigante em gravidade zero; e o tempo infinito como tempo de criança. Gosto desses momentos. Quando eu era criança me encantavam as ampulhetas, poderia passar horas vendo aqueles grãozinho de tempo se espremendo em uma passagem estreita. “Será que o tempo acelera à medida que se afunila?” Hoje eu sei essa resposta.
Um dia eu acordei e me dei conta de que estava dentro dessa correnteza muito rápida. Que de alguma forma estive distraída fazendo coisas demais, e se continuasse assim, amanhã teria 80 anos sem perceber. Sim, acho que o tempo acelera quando afunila. Ou, o afunilamento de possibilidades acelera o tempo. A finitude torna-se palpável quando vejo que não tenho mais todas as possiblidades à minha disposição. Aos 44, há coisas que nunca poderei me tornar; estão definitivamente fora da minha vida. Nunca me tornarei uma ginasta olímpica, nem bailarina. Sinto que preciso escolher sabiamente o que quero fazer da vida que me resta. Estou trabalhando nisso. Mas a primeira certeza que tenho é que desejo uma vida mais simples, mais devagar, onde seja possível ver o tempo passar, onde eu possa me envolver mais com as ações e pessoas que amo e valorizo.
Esse espaço é o meu manifesto por uma vida mais simples, mais autêntica, mais zen. Uma forma de dar atenção aos pequenos detalhes da vida. Escrever, fotografar e filmar são para mim formas de observação cuidadosa – da beleza de uma luz entrando pela sala em certo horário da manhã, dos pássaros cantando na árvore da frente, de um momento de troca com quem se ama – de tantas pequenas coisas que nos passam despercebidas.
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